quinta-feira, 9 de junho de 2011

o lirio e a árvore

o lirio todos os anos nascia e crescia naquele cantinho rodeado de malmequeres e flores silvestres, mesmo junto à grandiosa árvore que paria muitas e brancas flores de salgueiro.
os bolbos dos lirios conseguiam reproduzir aquela familia de lirios roxos e apaixonados todos os anos após a morte dos seus antecessores, chegada a primavera febril, ardente e viçosa.
a árvora gigantesca mantinha-se fiel a si própria vestindo-se e despindo-se das sua flores brancas conforme o inverno se despedia e a primavera se anunciava.
o lirio achava-se pequenino, sentia que não conseguia produzir o efeito tão produtivo como a árvore, que, por sua vez, oferecia sombra aos caminhantes e mirava-se constantemente no espelho do rio.
mas, a atmosfera prodigiosa daquele canto, tinha muito que ver com a fragrância doce que o lirio emanava e oferecia a toda a gente que passava no bosque.
Um dia, o lirio, após anos de admiração p´la árvore, já cansado, resolveu conversar e confessar o seu amor tão grandioso como de platónico.
a árvore ficou lisonjeada, vaidosa, curiosa, e mais do que nunca mirava-se ao espelho do rio e dizia:
....sou grande, tenho umas flores de cor cândida, dou sombra, os meus galhos quando despidos, dão uma infinidade de coisas, portanto, não posso de modo algum, descer ao nível do lirio, que, apesar de possuir uma  linda cor e emanar aquele cheiro saboroso e estonteante não passa de um simples lirio..... mas.....a verdade é que não o conheço muito bem....mas deve ser pouco inteligente, nunca fala!!!
o lirio continuou a fabricar o seu polen cada vez mais profundo, cada vez mais apaixonado, imaginava o dia em que a árvore descesse um pouco os seus esguios ramos para lhe acariciar as pétalas roxas e sedentas.
passaram alguns meses, anos e um dia o lirio disse á árvore:
não consigo perceber porque gosto tanto de ti, oh árvore, tu nunca me falas, nunca me dizes algo que me alegre e nem sequer me tocas com as tuas folhas tonalizadas de deslumbrantes verdes, nem tampouco,me mimas com as tuas flores brancas como hostias.....
certamente não gostas de mim, nunca deste p´la minha existência, e, olha que, teimosamente, todos os anos renasço para ti...
a árvore hipocritamente respondeu:
Oh não, lirio, não é essa a ideia, eu gosto de te olhar, mas repara, eu sou grande, muito grande e tu és tão pequenino...que iriam dizer as minhas amigas árvores também tão grandes??? e.... tão pequeninas às vezes!!!.
não faz mal, árvore, vou dedicar-me às borboletas, são tão bonitas, por dentro e por fora, tão frágeis e adoram-me, sinto que tenho sido injusto com elas, que, todas as manhãs, tomam o pequeno almoço comigo, dão-me imensos beijinhos e adormecem nas tardes de calor sobre as minha pétalas.
a árvore na sua fantasmagórica grandeza, sentiu-se rejeitada, ficou tristonha, sem saber como reagir....nunca mais ninguém lhe falou tão carinhosamente como o lirio e assim melancolicamente despiu-se, antes do tempo devido, e assim foi definhando, nem sequer o espelho do rio lhe transmitia a beleza frondosa de outros tempos.... até que um dia, muito perto do inverno um lenhador que, por ali passou, cortou os seus galhos curvados e secos, para se aquecer à lareira, nas noites solitárias e frias que se avizinhavam.
o lirio depois de vivência amorosa com as suas abelhinhas secou e desapareceu levado p´los ventos a caminho do norte.
assim, o canto ficou apenas atapetado de folhas secas e flores silvestre já raquíticas e dobradas p´la força das chuvas torrenciais.
O lirio e a árvore podiam ter vivido um tempo de harmonia, felizes e apaixonados, mas após o  tímido diálogo, o lirio, ficou terrivelmente desiludido, apercebeu-se que a árvore era egoísta,e que tinha passado tantos anos a sonhar com a árvore errada, foi um sonho inutil.............. daqueles sonhos que acontecem muitas vezes........

Ofélia Cabaço   09-06-2011

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