quarta-feira, 13 de maio de 2015

Ela,

Numa excelsa pradaria
Profusa de natureza e luz
Colhi lírios para Ela
Corremos entre o linhal e o anjo sorria
Ofertou-me um braçado de girassóis
Compus auréola cor de açafrão sobre seus caracóis
Dela resplandecia candura de Hemera,
Calma e doce, como só a primavera,
Descansamos num jardim plácido inominável
Ouvi minha voz interior: ah como Deus é o elemento vital
Do Universo, meu amor por Ela é infinito
E tamanho como a Luz de hélio

Sua boquinha tingida de amoras ciciava: vovó
Sobre nós, um céu cerúleo saudava-nos
Minh´alma, então bucólica, exultava d´alegria
Apoteose do meu querer que me ajuda a ser o que sou
Sorvendo a beleza das coisas e pensando espírito

Momentos efémeros onde brilham cores iridescentes
Em formosas tardes quando as manhãs são cristalinas
Belas, puras e cândidas, como o coraçãozinho da Carolina.


Ofélia Cabaço
2015-05-13





segunda-feira, 11 de maio de 2015

Somos o que Somos...

Somos o que somos
E seremos o que fomos…

Vivemos apenas um dia
Tão longo e pequeno tanto
Choramos quando inda amanhecia
E ao meio dia o entorpecido pranto
Aparece sem véu e encanto

Caminhamos por desertos intermináveis
Na busca dum abrigo destinado
É infinda a cerração, densa é a noite
Continuamos a passos incontáveis
Percorrendo o caminhado,
Sucedem-se vendavais…

Privados de esplendor, os ideais
Hirtos como os pinheiros na floresta
Teimosamente sobrevivem, funesta
Juventude de idílios com música de oboé
Suave como a leveza da brisa matinal,
Arquétipo d´harmonia e bom senso
Rostos e desejos,
Que se alavam com cheiros de pinho e hortelão
Enunciando vida com ardor e emoção
No dia longo e pequeno tanto
Caminheiros, somos, desta vida para a outra…


Ofélia Cabaço
2015-05-12







sexta-feira, 8 de maio de 2015

O Tempo e o Alpendre

O teu rosto é flor e água, é prata
Fio cristalino que me leva ao vento
O teu olhar é turquesa, fina gaze dos teus tumultos
Luz que me guia, e ilumina a minha escuridão
Tua boca é romã do meu pomar
Tu, que amo e não amo às vezes…
Sepulcro da minha história, o teu indizível grito
Que apela à minha dorida alma,
Como a manhã que arrebata a escuridão, branda
É a tua voz, melodiosa como o som da flauta
Tuas mãos são o atalho que me levam à montanha
E ali, onde o silêncio e a verdade se escondem
Espero os teus afagos…
Não importam os tortuosos atalhos
Quero chegar ao fim e elevar meus braços
Sussurrar-te o meu amor,
Existe um tempo em que o desespero cansa
O cansado…
E uma minúscula abertura reluz a comunhão
Do nosso amor,
Quase em segredo surge um dia abençoado
Que nos lembra a beleza das tardes, juntos
Sob o alpendre de aromáticas e roxas glicínias
Tu e eu juramos amor eterno e a tarde quente
Voluptuosa, brincava com os nossos caracóis
E ruborescia as minhas faces em tons crepusculares
A beleza daquela ardente tarde inda hoje é
Jovem e resplandecente…
Quem me dera a manhã candente daquele dia,
Espiral de harmonia, evolando-se numa infinita fita
Pelos céus da minha ilha, azul e verde e cor de nácar
Réstia da alegria sentida …
 Concebida, verdadeira como a pureza das açucenas.

Ofélia Cabaço
2015-05-08









terça-feira, 5 de maio de 2015

Beija-Flor

Ouvi um Beija-Flor dizer-me de ti
Encheu-me o coração como quem ergue um hino
Imaginei-te tonto e desgrenhado porque de ti esqueci
Sem noivado e muito amor renego o destino
Hinos de alegria e glória na minh´alma
Serão consolo, asas de esperança e calma
São desejos potentes d´amor e paz, firmeza
Sobre os meus sonhos derrubados, crueza
Da intempérie que a minha caravela destruiu
Pombas brancas como a alva ergueram meu espírito
Até então adormecido, ilusória fui
Para um lugar de cometas com rosto
Afugentei de mim cisma e desgosto
E o Beija-Flor sobre meu ombro descansou…


Ofélia Cabaço
2015-05-06


segunda-feira, 4 de maio de 2015

Um Olhar, Um Sorriso

Esquecemos sem inquietação
Imagens belas de campos em floração
De insondáveis recordações e beleza…
Deixamos que se desvaneça a certeza do outono
Com a incerteza do nosso descontentamento
Recordamos a primavera última, esquecendo a primeira,
Gestos d´um fulgor adormecido em flor de amendoeira
Emergem as algas e submerge o encantamento
Os lagos correm incessantes a par dos dias e dos anos
Debruçados sobre suas águas envelhecem os narcisos
E a lua não consente a sua imagem refletida…
Mas, um olhar indelével e um radioso sorriso
Embevecido de prazer num passado tempo e espaço
São marco de guerreiro no coração da esperança
Perpetuando um momento inatingível para lá do impossível
Oh! Adágio, som musical sobranceiro e magnífico
Porque insistes recordar-me o que nunca perfumei?
Foi tão só um olhar fugaz como o voo dum sublime pássaro
Quando foge da glacial montanha, de si amparo
Voando na busca d´outro destino…
No firmamento as estrelas sidéricas conduzem aos caminhos
Na Terra, e nas fervilhantes ruas, procuro em vão, outro sereno olhar
Mas as ruas já não são as mesmas e os sorrisos são devaneios
Dum caído altar…
Emudeci naquele olhar iluminado, adornei meu coração de amores
Mas a bruma, teimosa, insiste numa empolada confusão de ardores
E guarda para mim uma realidade que em si, é Nada…

Ofélia Cabaço
2015-05-05


domingo, 3 de maio de 2015

Se Não existe Fim

Sou amiga da amiga de mim
Sou eu de mim e só de mim a amiga
A estrada que percorro tem viga
Sobre minhas costas lobriga um fim
Fim? Se não existe fim de mim,
Renovo nascimento e diferente vida início
Aliviadas minhas mágoas, com esperança e avidez
Rumo para o Novo, devagar, serenamente balbucio
Uma mãe quero ter desta vez…

Não, sem antes, despedir-me dum cenotáfio
Erigido no meu coração em memória de minh´avó
Lembrar-me e pensar indizivelmente do frio e medo
Que nas noites invernosas me faziam verter lágrimas a fio
Ela afugentava o mal de mim, acalentava-me em seus braços, credo,
O barulho das árvores que se remexiam lá fora era azedo
E as sombras sobre a cómoda do meu quarto, impertinentes
Atormentavam o meu sossego e minha mente…

Lembrar aquele dia que soube que eu sabia ler, orgulhosa
A sua primeira neta lia para ela… realização gloriosa,
Dizer-lhe mil vezes obrigada com lábios trémulos, inda hoje…
Sofreu o que eu sofri, chorou o que eu chorei, afeição imensa
Repousada no silêncio da morte que é vida menos densa

Sei que ninguém irá perturbar seu descansado sono!
E sei também que a amei como a pujança das estações do ano,
Com a veemência do florescimento na Primavera
E como a intensidade das cores, na  despedida do Outono.

Ofélia Cabaço
2015-05-03









LOGOS

Tu, que eu não vejo, e estás ao pé de mim 

E, o que é mais, dentro de mim — que me rodeias 
Com um nimbo de afectos e de ideias, 
Que são o meu princípio, meio e fim... 

Que estranho ser és tu (se és ser) que assim 
Me arrebatas contigo e me passeias 
Em regiões inominadas, cheias 
De encanto e de pavor... de não e sim... 

És um reflexo apenas da minha alma, 
E em vez de te encarar com fronte calma, 
Sobressalto-me ao ver-te, e tremo e exoro-te... 

Falo-te, calas... calo, e vens atento... 
És um pai, um irmão, e é um tormento 
Ter-te a meu lado... és um tirano, e adoro-te! 

Antero de Quental, in "Sonetos" 


A Ama (Avó)

As mães que não são, mas criam
Que amam o abandonado, o órfão
Têm abrigo protetor no coração
Espaço para amor e ralhos
Um altar bendito, iluminado
Com berço para os que ficam
Pão e água com amor repartido
Sorrisos que escondem o angustiado
 Mãos grandes, que afagam, tocam!
Não existem pensamentos de ida
Olhares condoídos (…) fica!
Noites de tempestades, aconchego,
Febres e arrepios agasalhados
Beijos, lágrimas de contentamento
Êxitos inesperados, coragem
Os filhos, homens com dignidade
Felizes, irremediavelmente Filhos!
Rumo aos caminhos da vida, liberdade
Conselhos, reprimendas à mistura,
Saudades do bebé, tortura!
Mães que não são, mas foram!
Presentes nos labirintos, as mães!
Com vassoura afastam agoiros,
Têm garras de leoa, ninhos intocáveis,
As mães que não são, mas criam!

Ofélia Cabaço  2013-05-05