segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Anúncio Matinal



Ouvi o canto das andorinhas
Adornado de sorriso e esperança,
Arauto primaveril, nesta manhã gélida
Dum fevereiro sobranceiro, frémito,
Indeciso como ténue luz que balança...

Harpas irão tanger melodias, montanhas,
Cortinas harmoniosas e música, súbdito
Da paz nos corações agitados...

Primavera de todos e tão minha a magia
Voz que dá vida como o nascer do dia...
Os campos vestem tons de vergel e os narcisos
Aromatizam margens de rios e lagos, preciosos,
Na janela natural onde airosas petúnias saúdam a noite,
Serena e doce, real ventura em que se existe...

Borboletas dançam no coração das flores, pimpolhas
Desabrocham enfeitando pérgulas e encostas, mantilhas
Roxas tecidas nas videiras, néctar, bebida e alimento
É a primavera perfumada, entre movimento
E ação, que nos afaga ante nossos ais...
No silêncio calado e morno, as formigas vão e vêm
para o abrigo que as acodem...

Ofélia Cabaço
2016-02-22







domingo, 21 de fevereiro de 2016

Poesia

Da inquietação o desassossego obreiro,
O explicável do inexplicável,
Sofrimento, ânsia, sonho derradeiro
E um amar inelutável...

Inconformada,
Ânsia de amar e ser amada
Extensão plena, amplitude, desejo
De Amor ao limite do ilimitado
Quanta dor, ensejo
Desolado e efémeras esperanças
Um querer dizível a si, que o vazio rejeita
Que nem a um filho que o peito aleita...

Sonhos e brisas harmoniosas, no tempo
Em que viveram poetas trajados de sedas
E onde os rios corriam e saciavam a Sede,
Dos que se procuravam, e sem descanso
Buscavam Verdade no Sentido imenso...

Do alto dos montes o clamor sucumbia, nos campos
As searas ondulavam, e a brisa leve, concebia aos poetas
Formas maravilhosas de poetizar a Beleza no Tempo,
Não se acharam os poetas no útero mátria...

Ofélia Cabaço
2016-02-21




sábado, 20 de fevereiro de 2016

Morte

Semideusa ou deusa
à morte julgo...
Seja nada e do nada que é Nada,
Antes da Existência foi Nada...
A morte existente, subtilmente calada,
atenta no espaço, e ao tempo da ceifa
se enrola na matéria como uma regueifa,
No instante em que graça generosidade
ao enfermo sofredor, e ao espírito, liberdade!

Morte...
Caminho vácuo para a luz do eterno
Recomeço da vida antes nossa,
aonde as gentis almas não sabem abandono
Premente tanto, no compasso de espera...
Morte...
Velha, curvada e não cansada
À dor assiste pela hora desgarrada...

Ofélia Cabaço

2016-02-20



segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Perdi Quase Tudo,

Perdi o acreditar
no que as gentes idolatram,
Perdi pai, pedi mãe,
Perdi a alegria do que seria
a minha vida e vida teria,
Perdi afagos, perdi instantes,
Perdi a imagem em que os vi, ininteligível...
Não era de papel, era terna e aprazível
em memória jaz, indissolúvel;

Sei quando a manhã por mim passa
trespassou montanhas, bosques e ravinas,
São longas as estações, muito mais que as minhas!
Perdi quase tudo e do perder nada perdi...
Conservo comigo, e só, a profundidade do Belo,
O encanto da beleza dos campos, elo
Silencioso da tristeza e dor, com uma só flor...

O contemplar a Lua e as insólitas madrugadas
Buscando no infinito um sorriso e uma fada
A flor que desabrocha na rudeza das rochas,
Contemplo...
As cascatas e suas águas em estreitos berços, queixa
minha que o ar traz e não me deixa...

Perdi o desaparecido sem aparecer, pereceu
e eu não sei de nada, entre a Terra e o Céu
Perdi espaço irremediável, perdi divindades,
Perdi a canção que me embalou, o canto das aves
Ficou, e o verso do poema de mim pendente,
Aquele que me cobre e cujas sementes
levam os pássaros...

Ofélia Cabaço
2016-02-15









sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Angústia

Chove sem parar, tudo é todo,
Numa vénia contida choram os salgueiros
A terra tornou-se lodo...
Nem réstia de luz entre os ulmeiros

Assim é costumeiro...
Ver-se ao longe catedrais de nevoeiro,
Nada se mexe! o vento cansado,
Para além recolheu-se sossegado;

Não consigo sonhar neste dia, pressinto
Que a dor tamanha não consinta,
Ouvir a voz que me atormenta...
A angústia que me acorrenta;

Eu sei de mim e dos mudos também,
Aqueles que se inclinam e sussurram amem,
Exaustos vislumbram estrela nenhuma

E a chuva passeia de mão dada com mais umas
Almas que escavam na escuridão, vão
Em busca de liberdade e uma nação...

Este mundo físico Deus meu,
por Si criado o Universo, Timeu
versou, e eu? Ergo as mãos ao Eterno.

Ofélia Cabaço
2016-02-12




quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Hoje, o Nevoeiro é Imenso..

O nevoeiro é denso neste choroso dia,
procuro os Amigos por sua via
onde estarão os mais? Aqueles
que me sabendo me amaram eles...

Os outros dizem-me serem amigos,
de mim gostam, quanto eu suporto os desamigos,
Outros são, os que repoisam eternamente,
e em dias de bruma se aprumam em visitas,
no silêncio dos meus dias me deixam contente...

Hoje, o nevoeiro é molhado e denso
lembra-me que minh´vida é outono,
sonata que ata e não desata o imenso
sofrimento entre balada rude do oceano
e o anunciar do dia duma cotovia...

O outono tem cores e coração de flores
Minh´vida é outono e reminiscências, peço
que chegada a noite, quando adormeço,
me esqueçam os fantasmas, sossego e odores
eu desejo onde moro e comigo minh´alma...

Ofélia Cabaço
2016-02-10



sábado, 6 de fevereiro de 2016

Minha Avó

Um dia minh´avó me contou,
que em tempos sofrera de estranha moléstia
e só bebendo o orvalho da videira,
que de noite, Nossa Senhora abençoou,
conseguiu cura verdadeira;

Donzela e bela à parte sua modéstia
dali por diante saúde irradiou
Tinha cabelos da cor do trigo, mudou
da noite para o dia a cor para branco
nesse ponto, ficou igual a Petra, sua tia,

Branca e pálida sempre fora a sua tez
mais alvacenta ficara daquela vez
Seus olhos, então, da cor dos prados
tingidos foram sem qualquer brado
castanhos e suaves, iguais ao coração das margaridas
se tornaram, repletos de adoráveis matizes...

Tempos com tragédias idas
Minh´avó pálida e de castanhos olhos
Cabelos da cor do algodão, de grande coração,
Grande, como o mais alto do milheiral
altiva e arrebitada, a cada hora, conselhos!
Foi à beira d´água um robusto mural.


Ofélia Cabaço
2016-02-06







Ilha das Flores

Num sonho que não existiu em matéria,
e que eu vi, existente em quimera
Um príncipe com olhar florentino
Uma princesa ansiosa d´amor libertino

Uma ilha solitária, florida e tanto,
Vozes roucas, distantes, sacudiam tragédia,
E o mar, diluindo no ar som e tormento,
embalava o soçobrar do meu talento...

Borboletas roxas dançavam em paralelo
e a luz mansa e pálida em cada dia...
Lugar onde não há vãs promessas
aonde as Constelações são nossas,

Ansiando e pensando ao que vinha
disfarcei um ai e mágoa minha,
Sorvi néctar, comi terra e bebi mar,

Como a primavera tímida espreita o Inverno
entrei de mansinho, vivi a ilha das flores
e fui Astro, e fui Lua e fui Sol fraterno...
Lá, onde o paraíso se reflete de encantos e amores;

Ofélia Cabaço
2016-02-05