Pensativo
um homem no Café observa:
Na
rua, outro homem abraça o filho
Em
frente um jardim lavado, a chuva
As
folhas caídas das árvores jazem no chão
Assim
como a sua ilusão…
Atrás
das vidraças uma velha tricota manta de lã
Na
sinuosa rua ao lado uma rapariga e sua bicicleta
Um
cego, na esquina toca um fado
A sua
vida e o seu acordeão
O
homem senta-se à mesa, a sua habitual,
Fuma
mais um cigarro e finda o maço
A
televisão do café tremelica, as imagens saltitam
No
passeio, muito extravagantes, deambulam senhoras
Com
ar muito elegante, de fraque, passam os agiotas
O
mendigo pede e tem as calças rotas
As
aranhas também passeiam, no chão do Café
O
homem deixou cair um cigarro do maço novo
As
formigas revestem-no de preto
Em
frente do Café há um edifício a cair de podre
O
homem levanta-se e sai
Tem
vestido um fato cinzento e gravata preta
Usa
bigode e um chapéu
Passa
pelo jardim e o varredor cisma com as folhas
Sussurram
com olhos fundos, algumas velhas
Na
mesa do Café há uma queimadura
E o
homem disfarçou-a maduramente
Pois
acredita no inacreditável…
No
espelho, vê na sua cara, a cara do Mundo
Uma
cara que nada tem de Adónis
Duas
feias rugas vingam-se na sua testa
Consome
outro maço de cigarros…
Volta
ao Café…
Os
clientes bebem as vinhas do Dão
Estão
revoltados com o Adão
A
mulher da limpeza, ingenuamente
Elimina
o cigarro vestido de formigas
A
queimadura da (sua) mesa do Café persiste
As
moscas confundem-na com mel
Insistem
tal qual ela persiste…
A
prostituta gorda com lábios vermelhos
Insinua-se…
O
dono do café cicia ao seu ouvido
Uma
mendiga, pede e chora
O
pobre dos pobres não ouve, ora,
O
homem ampara a sua cabeça, desassossego,
A sua
alma diz-lhe algo…
Levanta-se
e dirige-se para o seu quarto
Fica
no edifício em frente, o podre,
Tem uma
janela que não tem luz
Há um
vaso de barro,
A
terra mantém vivo o seu malmequer.
Ofélia
Cabaço
2015-01-05
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