segunda-feira, 11 de junho de 2012

Aquilino Ribeiro




Grupo Seara Nova

Aquilino Ribeiro

Aquilino Ribeiro nasceu  a 13 de Setembro de 1885 em Carregal de Tabosa, concelho de Sernancelhe. Faz a sua instrução primária em Soutosa, onde os seus pais  residiam na época. Depois muda-se para Lamego e Viseu, onde entra  para o seminário. Como não tinha vocação para ser padre desiste.

 Durante a agitação republicana em 1906, muda-se para Lisboa, onde começa a escrever os primeiros artigos em jornais. Um ano depois é preso por consequência da explosão de uma bomba, mas consegue evadir-se e, entre 1908 e 1914, vive entre paris e Berlim.  Volta a Portugal em 1914 aquando da eclosão da I Grande Guerra. Publica o seu primeiro romance em 1918. “ A Vida Sinuosa”, dedicou aquela obra à memoria de seu pai, Joaquim Francisco Ribeiro. É convidado a trabalhar na Biblioteca Nacional  por Raul Proença, em 1919. E, é a partir desse ano que escreve sem parar, "Terras do Demo" (1919), "O Romance da Raposa" (1924), "Andam Faunos Pelos Bosques" (1926), "A Batalha Sem Fim" (1931) e muitos outros títulos. Envolve-se em disputas contra a ditadura militar mais propriamente  no Porto e em Viseu. Por consequência, exila-se por duas (1927 e 1928) vezes em Paris, onde casa pela segunda vez (a primeira mulher falecera). A seguir, o seu trabalho literário cresce a cada dia, "Volfrâmio" (1944), "O Arcanjo Negro" (1947), "O Malhadinhas" (1949), "A Casa Grande de Romarigães" (1957), "Quando os Lobos Uivam" (1958). Este último livro, quando  é publicado é de imediato apreendido pela censura e sucede-se   um processo em tribunal. Então, Aquilino decide viajar para Brasil, Londres e Paris. Em 1963, durante as comemorações do 50° aniversário do seu primeiro livro “A Vida Sinuosa” promovidas pela Sociedade Portuguesa de Escritores, então, presidida pelo escritor Ferreira de Castro, Aquilino Ribeiro adoece inesperadamente e morre a 7 de Maio de 1963, tinha então, 78 anos.
O livro que mais amei foi “ Quando os Lobos Uivam”, até o título era sugestivo e muito profundo. Foi com a publicação deste livro que o autor teve um mandato de captura a apreensão de todos os seus livros editados, pelo regime de Salazar.
Naquele livro Aquilino descreve a dureza da vida das gentes da Serra dos Milhafres, muito especialmente a história de vida de Manuel Louvadeus que tinha vivido no Brasil durante dez anos e devido ao silêncio das suas cartas, Filomena, sua mulher e os seus dois filhos Jorgina e Manuel, já o consideravam morto. O Brasil era uma terra longínqua, onde se dizia que quem para lá ia não voltava.
Um dia, Manuel Louvadeus, consegue voltar à sua aldeia. Durante a sua estada no Brasil, leu muitos livros e veio mais conhecedor dos seus direitos. Daí a sua intervenção corajosa quando o Estado Novo  quis  expropriar os terrenos baldios que sempre tinham sido o sustento da comunidade da Serra.
Manuel Louvadeus consegue informar os aldeões relativamente ao que estava certo e errado para o bem dos habitantes da Serra dos Milhafres. Assim o povo começou a ouvi-lo e a respeitá-lo e a deixar de ter tantos receios pelas ameaças dos “cabancas” do Estado, especialmente a G.N.R.  que se infiltrou naquelas paragens com esse intuito.
Aquilino Ribeiro descreve naquele livro a ignorância de um o povo trabalhador e honesto que sem qualquer alternativa de ensino, obedecia cegamente aos mecanismos fascistas da época.
Os tribunais agiam de acordo com a ditadura. Aquilino Ribeiro denuncia toda a maldade do Estado e o seu aproveitamento da humildade e da natureza genuína do povo beirão.
José Saramago quando ganhou o prémio Nobel da Literatura disse que, se o Aquilino Ribeiro fosse vivo, seria ele a ganhar aquele prémio.
Só percebe realmente aquele desabafo de José Saramago quem leu e lê Aquilino Ribeiro.
No livro “ Quando os Lobos Uivam” há uma discrição que eu acho particularmente bela.

“ Manuel Louvadeus subiu os degraus. Em cima, no patamar, topou a porta fechada e deteve-se, quando ia para bater, como quem toma fôlego. Com a breca, achava tudo tal e qual! Os dez anos de ausência apagaram-se como um sopro perante a obsessiva eternidade que se lhe oferecia ao lance dos olhos. Tudo na mesma, a velha aldraba, puída de tanto se lhe pegar, o espelho da fechadura escantilhado a uma banda, a couceira de lenho fibroso e terso, não chamassem ao castanho os ossos de Portugal. Quer á roda, o alpendre de telha vã e os esteios esgrouviados, a pedra negra da parede em que o musgo pastava seus herpes lucilantes, e ainda o silêncio, ah, este silêncio da moradia rústica, a desoras , humilde, suspicaz e atento como um rafeiro no ninho, quer por largo, os carvalhos do vale e os telhados próximos, se envolviam na antiga paz vesperal do céu e da terra, fusca e intáctil como a cobertura duma gare. Que distância, anos e anos que correram na levada do tempo, e as coisas conservaram-se ali iguaizinhas, estáticas, teimosas no seu ar de encantamento! Talvez mais velhas ….. sim, mais velhas, ferradas mais fundo pelos dentes  da morte  e a despenhar-se na voragem como as telhas do beiral.Era lua cheia, pelos fins de Março Marçagão, na altura do ano em que os dias são iguais às noites, e pelo tinir dos garfos e pausas intermitentes assentou para consigo que estavam a cear. – Miga bem a tigela! Dizia a voz materna, amorável no seu sotaque ralhado. – Miga bem Jaime, que só tens caldo! Depois a vozes calaram-se. Ressoam assim os córregos quando descem das serras  e tropeçam nos seixos solevantados. Mas ele que tinha que especular?!  Decidiu-se. bateu uma….duas….três vezes, e postou-se, parado, á escuta, como os mendigos depois de rezarem o padre-nosso.”
Este regresso tão cheio de saudades e incertezas, com a observação ao pormenor dos traços originais da cada coisa, era realmente um relógio de saudades sem horas.
Aquilino tem frases de uma sábia escrita no mais distinto dicionário português! Pessoalmente, quando leio Aquilino é imprescindível ter o dicionário da língua portuguesa à mão, mas o dicionário de oiro de Aquilino Ribeiro, estava no saber incontornável do povo genuíno, bom, trabalhador, humilde, sábio que acompanhavam as vozes alteradas pelos ventos das serras do demo. Eles e só eles sabiam articular palavras sentidas pelo abandono do conforto, da justiça e até das inquietações existentes naquelas paragens tão longínquas e tão desconhecidas.
Assim, Aquilino incomodava o poder vigente, incomodava o ditador António Salazar e não tinha descanso.
Salazar um dia disse a um jornalista acerca de Aquilino “ é um inimigo do Regime. Dir-lhe-à mal de mim; mas não importa : é um grande escritor.”


Ofélia Cabaço – 2012-06-07


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