sexta-feira, 18 de abril de 2014

Gabriel García Márquez




Gabriel, mais conhecido por Gabito era um menino muito curioso e também muito  assustado com as histórias dos mortos que sua avó contava. A avó era quem governava a casa, a casa onde ele foi criado com ela, seu avô e suas tias. Naquela casa havia um pátio onde nas noites quentes de Aracataca o aroma de jasmim predominava todos os outros cheiros. Os quartos eram enormes com janelas e portadas onde  os mortos segundo Dona Tranquilina, a sua avó, passeavam e suspiravam todas as noites.

Para ela não havia uma divisão entre os mortos e os vivos, era como se vivessem numa comunidade separados apenas por uma cortina que não se podia desviar. Dona Tranquilina tinha nascido numa península  de La Goajira, de areais ardentes pelo sol imenso, de índios, contrabandistas e bruxos, daí toda a sua tendência para contar histórias acerca dos espíritos, invulgares e extraordinárias como se fossem as mais naturais no dia a dia dos vivos. Gabito todas as noites tinha muita dificuldade em adormecer, pois a sua imaginação povoada de histórias fantasmagóricas, durante a noite atormentavam-lhe.

Aquele menino que apreciava os aromas a nardos e jasmins e amava ouvir os barulhos incessantes dos grilos, como é tão natural nas noites dos trópicos, ficava sentado numa cadeira a ouvir a avó falar da tia Petra, do tio Lázaro ou da tia Margarita Marquéz, que morrera muito menina, e era muito linda, e que no decorrer das gerações tinha ficado na memória de todos.

O certo é que ainda hoje, segundo Garcia Marquéz, quando fica num hotel e está sozinho, todas essas histórias e receios o atormentam, pensando que os mortos estão passeando no escuro do seu quarto.

Luísa, a sua mãe, era uma mulher muito bonita que se apaixonara pelo telegrafista que  trabalhava em  Aracataca, e contra a vontade do Coronel seu pai, casara e depois do nascimento do Gabito foi viver para Riohacha, uma cidade nas margens do Caribe que em tempos tinha sido muito explorada por piratas. Lá teve mais quinze filhos. Gabito ficara com os avós até aos oito anos, altura em que o seu herói, o avô, morrera.

Assim terminava a sua primeira infância.

Lendo a história de Gabriel Garcia Marquéz, eu partilho com ele algumas das suas mágoas e muitos dos seus medos, tal como ele, fui criada pela minha avó e tias, e também, conversavam comigo, como se eu fosse  uma mulher adulta naquela casa. Percebo o que é pensar e acordar, sonhando que estamos a viver aquela passagem de vida, com a mesma casa, e aquelas personagens que povoam na nossa mente, umas vezes felizes, outras amarguradas.

Garcia Marquéz só voltaria a Aracataca muitos anos depois, em que as casas e os sítios, onde antes aconteciam a azáfama da apanha das bananas ainda verdes transportadas por carroças de bois para a estação férrea, a fim de viajarem para os Estados Unidos, estavam reduzidas a pó e ao mais completo silêncio de abandono e desolação.

Garcia Marquéz começou a escrever mais para demonstrar a um amigo que a sua geração era capaz de produzir escritores, e o certo é que produziu um leque extraordinário de escritores como Mário Vargas Llosa, Pablo Neruda, Jorge Amado, Milan Kundera e muitos mais.

Ainda hoje, para Garcia Marquéz, escrever é um prazer e simultaneamente um sofrimento, pois recorda que, quando era um simples jornalista era capaz de numa só noite escrever cinco ou até dez páginas de um livro. Lembra na sua entrevista a Plinio Mendonza, que duma só vez, e numa assentada, escreveu um conto. Hoje, já fica muito feliz se escrever um bom parágrafo num só dia. Acha que cada vez mais, escrever é um sofrimento, e, é porque o sentido da responsabilidade vai aumentado, e provavelmente não quer desiludir os seus leitores.

Cem Anos de Solidão foi escrito por Gabo, nome que os amigos lhe atribuem desde a sua adolescência e por influência das histórias contadas pela sua avó durante a sua infância, pois eram contadas, por mais cruéis que fossem, sem que ela se perturbasse minimamente. Daí, a sensação que ele mais tarde descreve, de que lembrando a avó e suas histórias conseguiu que a narração de Cem Anos de Solidão mostrasse uma verosimilhança daquelas histórias e imagens. Cem Anos de Solidão é um livro de magia, de vivências invulgares. A atitude de José Arcadio Buendía, marido de Úrsula, era a de um homem decidido e empreendedor. Foi ele que reorganizou a aldeia chamada Macondo, onde viviam cerca de trezentos habitantes. O traçado das casas foi realizado por Buendia e nenhuma casa  recebia  mais sol do que a outra, aquando o calor incidia com força sobre a aldeia. Em relação ao abastecimento de água, todas as casas estavam em posição para que o esforço fosse igual na obtenção da mesma. Macondo era uma aldeia que personificava o trabalho, organização e igualdade. Desta forma todos os habitantes tinham cerca de trinta anos e nenhum havia falecido. Ele era um homem muito especial, encheu as casas, em especial a sua, com gaiolas habitadas pelas mais diversas raças de pássaros. Toda a aldeia ouvia o cantar dos pássaros. Úrsula, chegava até a tapar os ouvidos com cera de abelhas, para não perder a razão da realidade. Ela era uma mulher de pequena estatura, mas de garra, nunca cantava e trabalhava de sol a sol. Admirei na personagem, o facto dela ser uma mulher que mantinha a casa arejada, limpa e devidamente arrumada, construindo desta feita um ambiente de conforto e prazer a toda a sua família. Eles tinham construído a sua mobília, rústica, é certo, mas dada a personalidade de Úrsula, tudo estava impecavelmente limpo e arrumado atá as velhas arcas onde guardavam a roupa lavada, cheiravam a manjericão. Muitas vezes, durante a minha vida pensei nesta mulher, e achei que ser como ela seria um privilégio. Ela aturava as manias que o marido tomava no seu laboratório no quintal, fechado muitas vezes durantes semanas e meses, com uma invulgar naturalidade. Era um homem vocacionado para as ciências e fundamentalmente um democrata, eu acho!  José Arcadio Buendía, levou um dia o filho Aureliano Buendía a conhecer o gelo, numa tarde longínqua. Macondo era naquela altura, uma aldeia com apenas vinte casas de barro, construídas na margem de um rio rodeado de pedras brancas idênticas ao formato dos ovos. Melquíades foi um cigano que trouxe um objeto desconhecido para os habitantes da aldeia, o íman. Todos ficaram maravilhados em como os tachos, as tenazes, os fogareiros e afins se deslocavam de um lugar para o outro. Os objetos perdidos apareceram magicamente através do íman.  Todos os anos havia ciganos que se instalavam nas proximidades de Macondo para mostrarem as novas invenções. E foi assim que José Arcadio Buendía comprou ao cigano dois ligotes imanados a troco do seu rebanho de cabritos e o seu jumento. Pensou na hora, que aquele objeto o iria  ajudar a encontrar ouro na terra. Obviamente que forçou todas as suas ideias e imaginação, quase tão extensa como o universo, com demonstrações para a obtenção do oiro. Claro, que foram esforços em vão, não encontrou nenhum oiro. E, sempre que vinham os ciganos ele engendrava tecnologias com as novas ciências trazidas pelos forasteiros.

Eu entendo que a imaginação sem limites é a de  Garcia  Marquéz, e isso   revi em muitos dos seus livros. É dono de uma fabulosa imaginação, mas muitas das histórias têm que ver com o seu passado em Aracataca.

Um dia, seu avô, o Coronel Nicolás Ricardo Márquez Mejía, levou-o a ir ver gelo em Aracataca, quando os ciganos visitavam a aldeia com trapezistas e dromedários. Então uma vez, fez abrir para ele uma caixa de pargos congelados para lhe explicar o mistério do gelo. O avô tinha sido um liberal que se formara com honra através dos ideais de Garibaldi e da radicalização francesa.  O Coronal tinha ido para  a guerra às ordens do general Rafel Uribe Uribe. No livro, Cem Anos de Solidão, a personagem  do Coronel Aureliano Buendía, fora imitada pelas características do  general Uribe.

Gabriel sempre recordaria as manhãs em que seu avô o levava a tomar banho nas belas cascatas de  águas cristalinas existentes em Aracataca que desciam velozmente pela serra. No silêncio das plantações, o coronel Nicolás , falava-lhe da guerra civil, dos canhões puxados por mulas, dos combates, dos feridos e até mesmo dos mortos. Todas estas conversas matinais ficaram para sempre na sua memória. De realçar que o velho concedia ao neto a maior importância.

Lembro-me, da minha avó dizer muitas vezes, que eu era tão esperta que quando nasci pus-me de pé na banheira. Quando mais crescida, eu ouvia isso, ficava envergonhada com esta ingénua afirmação, que não era mais do que o amor que ela me tinha. Os avós tradicionais têm os netos em altas nuvens. Não deixa de ser ternurento.

Kafka que também contava histórias quase da mesma maneira que sua avó, sem a mais leve perturbação, foi de certa forma, uma influência para Gabo, quando na adolescência leu  “ A Metamorfose”. Gregório Samsa podia acordar uma manhã transformado num gigantesco escaravelho, e disse para mim: “ Eu não sabia que isto era possível fazer. Mas se assim é, escrever interessa-me” Reportagem de Plinio Mendonza a Garcia Marquéz. Plinio Mendonza foi embaixador de Bagotá em Lisboa e é padrinho do filho mais velho de Garcia Marquéz. Sabemos que o escritor tem dois filhos e é casado até hoje com Dona Mercedes.

Numa das muitas superstições de Garcia Marquéz, a que acho mais piada, e até poética, é a de ter sempre na sua secretária um jarra com uma rosa de cor amarela. Bonito!

Não gostou dos deslumbramentos das carpetes vermelhas, da música de fundo, dos smokings, do cheiro a velas e a flores, quando foi a Estocolmo receber o prémio Nobel. Pensou estar no seu próprio funeral e para contrariar regras foi vestido de branco. A  determinada altura alguém disse: Porque é que o Gabo vem vestido de padeiro?

 

Garcia Marquéz ganhou o Prémio Nobel da literatura em 1982 com o seu livro Cem Anos de Solidão. Escreveu : A Revoada, Horas Más, Os Funerais da Mamã Grande, Relato de um Náufrago, Crónica de uma Morte Anunciada, O Amor em Tempos de Cólera, O Outono do Patriarca e muitos outros.

É um lutador pelos Direitos Humanos e o saldo da sua luta é difícil de calcular com as injustiças que o mundo, explicitamente ou  implicitamente oferece aos mais desfavorecidos. Creio que, acredita veementemente que todo o ser humano merece viver com dignidade.

Os escritores considerados, em determinada altura da sua vida, como grandes romancistas foram Ernest Hemingway  e Graham Greene, entre outros.

Hoje Garcia Marquéz sofre de um cancro linfático e segundo seu filho Rodrigo, conceituado cineasta, ele  não reconhece as pessoas, a não ser pela voz. Vive em Cuba e  além de admirador é amigo pessoal de Fidel de Castro.

 

 

Obs: Garcia Marques é um dos escritores que eu admiro. Escolhi-o porque a  professora  Vera, disse-nos uma vez na aula, que o seu livro preferido era Cem Anos de Solidão.

Como agradecimento pela sua boa vontade e participação.

 

 

Ofélia cabaço  2012-06-10

sábado, 12 de abril de 2014

Ao Firmamento,


 O Pinheiro lugar não tem

De um lado ao outro é levado

Esquecido na sombra d`outros, lá,

 Aonde o Sol não chega

O Pinheiro, teimosamente cresce,

Uma solene sede abraça-o

Ferverosamente (…)

Um dia espreita o firmamento,

Veste-se de verde tonalizado

Enrubesce, vigorosamente

Quer chegar ao Alto dos Céus

Agradecer ao Além a graça,

Aos Sentidos de todos os sentidos,

E, perpetuar num só sentido, o seu!

Observar a inveja, lá do alto,

Salpicando desejos e amores

Conseguir pensar, e sorrir apenas,

O Pinheiro tão pequeno, nascido

No caos dum bosque obscuro

Cresceu, e cresceu não dobrado (…)

Libertou-se do bosque denso, compacto,

E caminhou (…) rumo ao infinito, ao Amor!

 

Ofélia Cabaço

2014-04-12